
Os ônibus ou metrôs das cidades são ótimas vitrines das atuais tendências de comportamento e, quem utiliza muito estes meios de transportes, tem neles uma constante fonte da citada nostalgia. Os aparelhos sonoros com fone de ouvido tornaram-se o grande álibi para a indiferença geral. Quem está “plugado” na maquininha, em tão alto volume que todos à volta sabem, sem esforço, qual a música escutada, desliga-se do entorno e, assim, ignora se, ao lado de seu assento, há um idoso de pé, uma pessoa de ar cansado e cheia de pacotes, um deficiente. Ceder o lugar parece totalmente fora de moda.
A eventual tosse não mais é amenizada com um lenço ou mesmo, a mão, sobre a boca. O passageiro da frente e do lado ficam à mercê da sorte, enquanto sentem no braço, no rosto ou na nuca as baforadas ameaçadoras. E por falar em baforadas, há aqueles que dão a última tragada no cigarro segundos antes de embarcar e expelem a fumaça já dentro do coletivo, sufocando os não-fumantes...
Pare o elevador, que quero descer. Tão constrangedor quanto o decantado silêncio entre os usuários, é subir ou descer andares entre pessoas que só conseguem falar gritando, não acha? Ou enfrentar uma verdadeira disputa, ao entrar ou sair, porque não existe mais aquela hierarquia tácita, por idade e/ou sexo. Ou ainda, partilhar compulsoriamente da conversa alheia, quando toca o celular. Aparelhinho que igualmente não é desligado nos cinemas nem nas cerimônias ou palestras, para desgraça de quem está interessado no que lhe apresentam.
No dia-a-dia, também é fácil notar que a polidez anda rateando, quando nos pedem alguma informação, seja a respeito das horas, de determinada rua, do itinerário de um coletivo ou algo parecido. “Por favor” e “obrigado” parecem ter sido banidos da língua portuguesa. O mesmo acontece quando atendemos a alguma ligação telefônica destinada a outro número: o “desculpe, foi engano” evaporou-se. E o que dizer das pessoas – do vizinho ao motorista de ônibus – que não retribuem o cumprimento? Dos balconistas que ignoram a presença do freguês? Dos motoristas que não dão passagem ao pedestre? Do amigo que, na despedida, lhe diz “um forte abraço”, em vez de abraçar...
É, Raul, não está nada fácil. Eu também vou reclamar.
(Baseado em crônica de Madô Martins)