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quarta-feira, 22 de agosto de 2007

Cansei ou cansamos?

Dois movimentos surgiram no País nos últimos dias. De um lado está o Movimento Cívico pelo Direito dos Brasileiros – logo batizado de Cansei. De outro, como reação, lançada pelo presidente nacional da CUT, Artur Henrique, despontou a campanha denominada Cansamos!.
Ao primeiro movimento, que participou em 29/07/2007 da passeata pelas vítimas do acidente do vôo 3054 em São Paulo, é lançada a pecha de tucano e, mais acidamente, de representante da rua Oscar Freire, em alusão ao caráter dos endinheirados que lá estariam. Não obstante a liderança formal da insuspeita OAB-SP, o Cansei seria só uma articulação liderada pelo empresário João Dória Jr., envolvido na campanha de Geraldo Alckmin nas últimas eleições.
Já o Cansamos! Nasce no seio do sindicalismo petista. Disputa o mesmo sentimento nacional, mas tem outro viés. No e-mail lançado pelo presidente da CUT o cansaço vem do “trabalho escravo, da sonegação dos impostos, da mídia que não aborda os movimentos sociais e da mídia que criminaliza as lutas populares”.
Não quero aqui tomar partido nesta disputa de bandeiras. Reconheço que ambos os movimentos – seja de ricos ou pobres, PSDB ou PT – tenta despertar a consciência nacional, propor caminhos, indicar lutas específicas.
Percebo, entretanto, um problema sério em toda essa articulação. Preocupa-me o fato que, no Brasil, estejamos envolvidos hoje pela indignação. Nada contra indignar-se, mas não acho que esse seja um caminho razoável para a construção da cidadania. Vou além: o ato de indignar-se deve ser uma nobre e forte exceção, nunca a regra numa sociedade. Ele deve surgir em casos especiais, insurgindo-se contra situações extremas.
Não é o que ocorre atualmente no País. Vivemos 24 horas por dia indignados com a política, os políticos, as empresas, a Anac, a mídia, o sistema e o diabo a quatro. Ninguém ou nada escapa: mergulhados estamos na mais completa descrença nas instituições e pessoas.
O interessante é que a indignação é só catarse. Quase todos estão revoltados, mas nada fazem de concreto no âmbito das suas microrrelações. Xingam e gritam pelas esquinas, mas continuam vivendo as suas vidinhas comuns, em muitos casos repletas de transgressões e ilegalidades. Não se muda nada, ninguém age, não há participação organizada.
Temo muito pela emoção histérica. No caso das massas, isso é particularmente preocupante. É o solo fértil para o desenvolvimento de manipulações, de populismos, de falsas lideranças carismáticas. É fácil ao leitor encontrar exemplos na história, mesmo na recente.
Da mesma forma que estamos enojados da política, certos de que o Brasil não tem saída, nem nunca terá, vamos às lágrimas de euforia no esporte. Os recentes Jogos Pan-Americanos, até bem organizados, não passaram de uma competiçãozinha de terceira linha, com atletas secundários, sem grande expressão internacional. Nenhum recorde mundial foi batido – nem de longe, diga-se de passagem. Mesmo assim, o ufanismo tomou conta do País, em contradição com o negativismo dominante.
No esporte, tudo bem que a emoção nos domine. Mas no resto, a coisa é mais complicada. Só com indignação, nada vai acontecer. Chega de cansei ou cansamos. (Alcindo Gonçalves)





"O que mais preocupa não é o grito dos violentos, nem dos corruptos, nem dos desonestos, nem dos sem-caráter, nem dos sem-ética. O que mais preocupa é o silêncio dos bons!"
(Martin Luther King)




O brasileiro foi rotulado como pacífico, o "homem cordial" - identificado por Sérgio Buarque de Holanda - que prefere ficar em casa, comodamente assistindo às baboseiras da televisão, a se manifestar em praça pública. Diferente dos argentinos que enlaçam as mulheres e suas panelas, vão fazer barulho em frente à Casa Rosada e derrubam governos um após outro, até conseguir seu intento. Até mudar o país naquilo que é possível.
Ao que se vê, a união necessária para o crescimento de movimentos populares está longe de acontecer. Continua prevalecendo o interesse corporativo ou individual, nunca o do bem comum. Não há patriotismo em nenhum dos "cansados" e a luta é pela salvação apenas do que interessa a cada um. Sem falar em interesses políticos, embora os dois lados afirmem que se tratam de atitudes suprapartidárias, apolíticas e em favor da sociedade.
Enquanto isso, enquanto um movimento anula o outro, o brasileiro continua em frente à TV, ouvindo silenciosamente a mentira institucionalizada, e o país segue envolto em corrupção, com enriquecimento ilícito, miséria crescente e locupletação pessoal de governantes, empresários e banqueiros.
E não há o que reclamar, pois o silêncio dos bons é tão comprometedor quanto a ação dos maus.

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